Afiliação Estudantil na UEFS: micropolítica e subjetividade #216

Coordenador:
Maria Eunice Limoeiro Borja
Data Cadastro:
07-03-2024 18:16:15
Vice Coordenador:
Clodoaldo Almeida da Paixão
Modalidade:
Presencial
Cadastrante:
Maria Eunice Limoeiro Borja
Tipo de Atividade:
Projeto
Pró-Reitoria:
PROEX
Período de Realização:
17/04/2024 - 19/11/2025
Interinstitucional:
Não
Unidade(s):
Departamento de Ciências Humanas e Filosofia,

Resolução Consepe 082/2024
Processo SEI Bahia 07133952024000738481
Situação Ativo
Equipe 3

O projeto de extensão apoia-se nas pesquisas qualitativas sobre o processo de afiliação estudantil que demonstram as especificidades do processo de passagem da escola à universidade, período que apresenta muitos desafios à aprendizagem do “ofício de estudante universitário”, conceito do pesquisador Alain Coulon (2008). O primeiro ano de um estudante universitário é decisivo para que possa situar-se em um novo ambiente em que as relações sociais pressupõem atitudes tanto mais propositivas, quanto orientadas às normas institucionais, proporcionando modificações subjetivas frente à sua relação com o saber e produção de conhecimento. Neste sentido, o projeto “Afiliação estudantil na UEFS: micropolítica e subjetividade” pretende contribuir para construção de um ambiente universitário de atenção e escuta do estudante em processo de afiliação estudantil, fortalecendo aspectos fundamentais à democratização do ensino superior. Entre eles, a compreensão sobre a mudança do perfil de estudantes ingressantes, suas demandas e dilemas enquanto sujeitos em processo de adaptação à vida universitária. Desse modo, o projeto alinha-se às políticas de permanência na UEFS e tem como objetivos específicos: 1) Realizar atividades formativas que promovam a compreensão do processo de afiliação estudantil, seus obstáculos e possibilidades de superação; 2) Desenvolver um ambiente formativo acolhedor que propicie modos de subjetivação favoráveis à construção de um percurso de afiliação bem-sucedido; 3) Promover uma micropolítica comprometida com a permanência estudantil na UEFS. O projeto será realizado por meio de oficinas presenciais e quinzenais com estudantes de graduação que ingressaram na UEFS entre 2023 e 2024; portanto, matriculados entre o 1º e o 3º semestres. Por meio de divulgação de formulário eletrônico enviado por e-mail, os estudantes que se interessarem serão selecionados para integrar o projeto. As oficinas tratarão de temas do processo de afiliação estudantil, seus obstáculos e possibilidades de superação. Pretende-se que a convivência em um ambiente formativo acolhedor e atento aos modos de subjetivação dos participantes resulte na promoção de vínculos afetivos e de cooperação para superação das dificuldades identificadas ao longo do percurso universitário, assim fomentando uma micropolítica favorável à permanência estudantil e, a longo prazo, maior interesse e participação em atividades de ensino, pesquisa e extensão.
O início da vida universitária geralmente está envolto em expectativas sobre um futuro almejado e associado à obtenção de um diploma, suposto representante de sucesso. Após longa preparação escolar, dedicação aos estudos e submissão ao concorrido ENEM, o ingresso em um curso universitário traz alegria e sensação de vitória. No entanto, nem todos estão cientes sobre as mudanças que a vida universitária exige. No imaginário social vigora a pressuposição de que a chegada à universidade é uma mera continuidade dos estudos secundários; porém, as pesquisas sobre a vida estudantil demonstram as especificidades do processo de passagem da escola à universidade. (Carneiro, V.; Souza, 2023, Carneiro, A., 2023, Paivandi, 2020, Silva; Sampaio, 2020, Mankovsky, 2015, Teixeira; Coulon, 2015, Coulon, 2008). O primeiro ano de um estudante universitário é decisivo para que possa situar-se em um novo ambiente em que as relações sociais pressupõem atitudes tanto mais propositivas, quanto orientadas às normas institucionais, proporcionando modificações subjetivas frente à sua relação com o saber e produção de conhecimento. Este período apresenta muitos desafios à aprendizagem do “ofício de estudante universitário”, expressão do pesquisador Alain Coulon (2008). As taxas de evasão no primeiro ano são um alerta para os conflitos advindos da incompreensão sobre as regras que regem o mundo acadêmico, bem como o esforço emocional para situar-se frente ao desconhecido. Neste sentido, no primeiro ano geralmente ocorre a decisão de permanecer ou desistir. Cabe esclarecer que a condição dessa permanência raramente está associada a objetivos estipulados para carreira. Coulon (2008) adverte sobre a afiliação intelectual e institucional enquanto processo crucial para estabelecer a permanência; contudo, pouca importância tem sido dada a esta constatação. De um modo geral, na universidade, os cursos se organizam em torno de competências exigidas do novo estudante; portanto, as abstrações relativas ao mundo teórico, em cada disciplina, propõem familiarização com novos autores e perspectivas epistêmicas. Segundo Coulon (2008), estudante recém-chegados encontram um sistema intelectual na universidade associado a regras formais, práticas de comportamento, de domínio de vocabulário específico, de intervenções orais oportunas segundo distintas situações, de práticas de escrita e leitura, de concentração. Para tornar-se um estudante universitário apto a seguir rumo à conclusão do curso, urge a aprendizagem ativa dos processos e categorizações do mundo intelectual. Além de se situar intelectualmente no mundo acadêmico, é essencial aprender a atribuir os sentidos relevantes e compartilhados na comunidade de docentes e colegas mais experientes. A teoria da afiliação enfatiza três fases pelas quais os calouros passam: estranhamento, aprendizagem e afiliação. O “tempo do estranhamento” ocorre quando o novato se afasta de um passado familiar relativo à escola ao iniciar seu cotidiano na universidade. “Diante dessa porta que se abre para a estranheza, o iniciante percebe um mundo que não é mais familiar.” (Coulon, 2008, p. 40) Sobre o tema, Barbosa, Borja, Ferreira e Sampaio (2020) retomam Freud em um texto intitulado “O estranho”, quando o autor trabalha com a ideia de que o inquietante, ou estranho, não é algo novo ou alheio, mas algo muito familiar que foi recalcado. Nesta linha, chama a atenção para a ambiguidade da palavra que, ao mesmo tempo, remete a algo familiar e causa sensação de estranheza, inquietação. Acrescentam que as inquietações e estranhamentos dos que ingressam na vida universitária apontam para os enigmas que atravessam os desfiladeiros da subjetividade e do desejo. Neste sentido, argumentam: A escolha de um curso universitário endereça o estudante a um espaço de convivência pulsante em descobertas e questionamentos, de encontros e desencontros os mais diversos. Há inclusive uma dimensão do encontro, ou do desencontro, com o seu desejo enquanto sujeito forjado pela linguagem. É a esse sujeito que nos referimos, aquele que emerge do desconhecido em si mesmo, suscitado pelas experiências vividas em um espaço de multiplicidades. E, deste modo, chamamos a atenção para a produção subjetiva articulada às experiências vividas na Universidade. (Barbosa, Borja, Ferreira, Sampaio, 2020, p. 4) O estranhamento vem entremeado ao tempo da aprendizagem. Muitas inseguranças, dúvidas e ansiedades surgem entre a distância de um passado escolar referido ao familiar e um futuro ainda não perceptível. Coulon (2008, p. 40) enfatiza: “Ele está no espaço entre dois momentos e não tem mais referências.” A sensação de estar perdido, até mesmo desestruturado, acompanha este período doloroso da aprendizagem. É uma travessia difícil que necessita de apoio e elaboração de novos sentidos. Importante enfatizar a convivência entre estudantes e docentes nas experiências de afiliação bem-sucedidas. Além da sala de aula, núcleos de pesquisa, grupos de estudos e atividades extensionistas fazem parte do ambiente formativo que as universidades públicas criam. O engajamento do estudante em diferentes grupos produz contextos relacionais específicos, significados e as habilidades necessárias à sua formação. Então, finalmente, pode-se anunciar o “tempo da afiliação”. O estudante aprendeu os códigos atinentes à vida intelectual, já experimentou várias atividades do mundo acadêmico e construiu certa cartografia das relações que podem guiá-lo no seu percurso e novas escolhas. (Coulon, 2008). Após o tema da afiliação estudantil ter sido introduzido no Brasil, ganhando força a partir da publicação do livro “A Condição de Estudante: a entrada na vida universitária” em 2008, várias pesquisas foram realizadas o país. Na Bahia, o Observatório da Vida Estudantil empreendeu quinze anos de pesquisas reunindo uma rede de estudos em sete obras sobre o tema (Sampaio; Santos; Borja, 2023, Santos; Sampaio, 2020, Santos; Vasconcelos; Sampaio, 2017, Santos; Sampaio; Carvalho, 2015, Santos; Sampaio, 2013, Santos; Sampaio, 2012, Sampaio, 2011). Rita de Cássia Leite e Rita Conceição Ribeiro (2017), discutiram os resultados da proposta extensionista intitulada Grupo de Atendimento Acadêmico ao Estudante (Gaae) implementada pela primeira autora na UFRB. As ações do grupo possibilitaram “aos estudantes refletir, individual e coletivamente, sobre o modo com estão vivenciando a vida acadêmica.” (Leite; Ribeiro,2017). As autoras destacam que um dos aspectos que favoreceu o processo de afiliação estudantil no grupo: reconhecer o processo de adaptação ao ensino superior e os elementos que o estão dificultando. Questões como a saudade dos amigos da escola, afastamento dos familiares, adaptação à nova cidade, hábitos de estudos, dúvidas sobre a escolha do curso, relacionamento com a turma e professores foram tematizados. Com o desenvolvimento dos encontros, notou-se que o próprio grupo vai formando “uma rede de apoio, de suporte emocional, permanecendo como tal inclusive quando o grupo de encerra.” Após três anos de pesquisas na UFCG sobre afiliação estudantil, Carneiro e Soares (2019, p. 18) identificaram “[...] a demanda para a criação de um espaço de aprendizagem em grupo e a troca de experiências, dúvidas e sentimentos.” Elaboraram então a proposta extensionista de “[...] um grupo de apoio acadêmico que pudesse ser facilitador para a permanência dos estudantes à universidade. Como ferramenta metodológica, foi escolhida a Oficina de Criatividade, que se utiliza de recursos expressivos para criar um espaço de elaboração de experiência pessoal e coletiva.” (Carneiro e Soares, 2019, p. 19486). Referenciando-se a partir da obra seminal de Alain Coulon (2008), as autoras ressaltam que vínculos recém estabelecidos na vida acadêmica têm natureza frágil e necessitam de cultivo para se consolidar; portanto, podem ser desfeitos gerando “o desejo de abandonar a universidade [...] e, na maioria das vezes, os estudantes não expressam quando estão a ponto de abandonar.” Como resultado da pesquisa, o sofrimento emergiu como principal característica a partir de “quatro sub-categorias: a) sobrecarga e rotina, b) competitividade, c) medos e ansiedade e d) experiências de frustração.” (Carneiro e Soares, 2019, p. 19490). Segundo as pesquisadoras: A partir das oficinas e da troca de experiência entre os participantes, foi sendo criado um espaço de vínculo e identificação, favorecendo as seguintes ações, que conjuntamente contribuem para a permanência: uma nova perspectiva dos problemas; a saída da solidão e o fortalecimento de vínculos As pesquisas sobre o tema, levantam que a tarefa de compreender as regras que regem esse novo mundo não são evidentes, além de levar um tempo para que as necessárias competências acadêmicas sejam assimiladas. Uma questão relevante é que, talvez, nem mesmo os docentes tenham clareza de que o ofício de estudante é algo a ser construído e de que necessita de tempo e orientação. Neste sentido, pensando na problemática da afiliação estudantil, Viviana Mancovsky (2015) questiona o ‘ofício docente contemporâneo” frente à mudança de perfil dos ingressantes nas universidades e dos diferentes modos de ser um “jovem trabalhador”, por exemplo. A autora indaga sobre a tarefa de cuidar de uma geração mais nova no sentido da transmissão intergeracional e afirma: Cuidar, antes de tudo, é estar presente e promover no outro as competências necessárias. Trata-se de um lugar a ser construído que tem a ver com escutar o outro a partir de uma determinada disponibilidade e compartilhar a experiência de saber, tentando compreender e transformar o mundo. (Mancovsky, 2015, p. 303). Essencial é a ação de escutar na comunicação com jovens, a fim de entender sua problemática. Apoiando-se em uma literatura que discute o cuidado com os jovens, a autora diz: “É disto que se trata, justamente, a disponibilidade e a calidez da escuta adulta, sustenta Bleichemar” e acrescenta: “Em conclusão, como profissional do ensino, o docente pode efetuar políticas de cuidado e acompanhamento dos jovens, a partir da disposição de saberes habilitadores de compreensão, entendimento, análise.”(Mancovsky, 2015, p. 305) A noção de “políticas de cuidado” nos remete ao diálogo com o antropólogo britânico Tim Ingold, a fim de contextualizá-la conceitualmente no âmbito da antropologia da educação. Para este autor, o cuidado é a dimensão ética da atenção que pressupõe “observar, ouvir e responder”. Para os seres corresponsivos, o cuidado é uma responsabilidade que se articula com a presença. “Capacidade de resposta” depende do estar presente: “Para cuidar dos outros, então devemos permiti-los estar em nossa presença para que, assim, possamos estar presentes para eles. Em um sentido importante, devemos deixá-los ser, para que possam falar conosco.” (Ingold, 2020, p. 48) Deixar ser se desdobra em ações que fomentam a autonomia do(a) estudante para pensar, criar, propor atividades e temas para pesquisar à medida que se engajam no ambiente. Importante contextualizar a reflexão de Ingold sobre o cuidado, pois está inserida em sua concepção de “educação da atenção”. Portanto, outras duas noções estão atreladas à tarefa do cuidado: correspondência e saudade. Correspondência é destacada como “o modo de se relacionar de um ser que habita no hábito e cuja postura é atenciosa. Pois é ao atender uns aos outros, na medida em que caminham juntos, que os seres correspondem.” (Ingold, 2020, p. 46). Esclarecemos que Ingold considera hábito como o “princípio da produção, em que um eu que habita em suas próprias práticas é recursivamente gerado por ela; portanto, “o hábito é o que o passar pelas coisas traz para a tarefa do fazer.” Percebe-se que não se trata de repetição consolidada, mas de um processo fundado na experiência que afeta e transforma a pessoa nas relações estabelecidas entre “o fazer” e o “passar por”. Para haver correspondência, é preciso habitar a experiência, estar imerso nela, empregar energia para as tarefas. Para Ingold (2020, p. 41), esta “habitação é fundamentalmente um processo de atenção.” A saudade é o terceiro elemento que está atrelado ao cuidado, compondo a tríade da educação da atenção. Segundo Ingold (2020), lembrar e imaginar são aspectos da saudade. A dimensão da presença está na lembrança na medida em que ativa a “correspondência” com pessoas e situações do passado, articulando-as com o presente vivido e o futuro almejado, promovendo novos sentidos e caminhos a construir. No contexto do processo de afiliação é importante considerar o elemento da saudade do estudante do seu tempo de escola, um, tempo passado em que o ambiente escolar era composto por rede de pessoas que não mais fazem parte a sua nova vida universitária. Reconhecer o próprio processo de transição da escola para a universidade, dar-se conta da ambiguidade entre a saudade do passado familiar e as descobertas de um novo mundo, articulando-as com o futuro em construção faz parte do processo de afiliação. Neste movimento, a imaginação e lembrança estão associados, amalgamando futuro e passado. “Em suma, a saudade torna possível alinhar o cuidado e a atenção, que dependem do trazer as coisas à presença, com o alongamento temporal da vida”, conclui o antropólogo. A noção de ambiente como variação ajuda a compreender como as experiências e a comunicação entre diferentes gerações produzem o “ter em comum” ao tempo em que permite a cada indivíduo fazer descobertas e escolhas. A participação de estudantes em grupos dá sentido ao “passar por” como engajamento perceptivo produtor de variação, do inesperado na formação acadêmica e na vida. A atividades em grupo não são meras tarefas, pois estão articuladas a uma série de práticas coletivas que geram correspondência, cuidado e saudade, dimensões da educação da atenção. Para compreensão do processo de afiliação estudantil, é esclarecedor trabalhar com as noções de ambiente e educação da atenção como importantes contribuições de Ingold (2020, 2015, 2010, 2000) para a antropologia da educação. Contrapondo-se a uma concepção representacional e mental do processo de aprendizagem, o antropólogo Tim Ingold afirma que “[...] todo ser humano é um centro de percepções e agência em um campo de prática” (Ingold, 2010, p. 7). Inspirado no legado educacional do filósofo e pragmatista John Dewey (2010, 1979, 1976), Tim Ingold (2020, p. 17) defende a ideia de que “a educação é uma prática de atenção, não de transmissão – que é através da atenção que o conhecimento é gerado e continuado.” Ao apresentar o pensamento de Dewey de que “[...] a educação é para a continuidade da vida [...]” (Ingold, 2020, p. 19), o antropólogo ressalta a ideia de que transmissão só faz sentido indiretamente e referida à noção de ambiente, ou seja, “para a continuidade da vida-em-um-ambiente”. Então, a partir do termo “ambiente” que compõe, juntamente com “comunicação” e “transmissão”, um tripé para a concepção filosófica de Dewey sobre educação, Ingold (2020, 2010) desenvolveu sua abordagem antropológica sobre educação como prática da atenção. Sendo a comunicação a comunhão da vida e, a transmissão, sua perpetuação, o ambiente é, então, a sua variação. Ou seja, não é simplesmente o que envolve o indivíduo ou a soma total de condições envolvidas. O que faz um ambiente é a maneira como essas condições são desenhadas, ao longo do tempo, em um padrão de atividade conjunta (Ingold, 2020, p. 20). Ao desenvolver sua argumentação, o autor pondera que a comunhão é gerada por criação contínua, movimento e crescimento a partir do compartilhamento de experiências. A variação decorre de um “ambiente social compartilhado” entre gerações que aprendem juntas, pois têm o que oferecer umas às outras justamente as suas diferentes experiências, não as semelhanças. Para Ingold (2020, p. 20-21), “a promessa da educação está na capacidade de responder e ser respondido: sem essa ‘capacidade de resposta’, por assim dizer, a educação seria impossível.” Neste sentido, a atenção é identificada pelo autor como “[...] o que realmente faz a diferença entre conduzir a vida e viver [...]”. Acrescenta ainda que a palavra “atenção”, em sua etimologia, “significa literalmente ‘alongar (tendere) em direção a (ad)” (Ingold, 2020, p. 38). Para ele a atenção é um “modo fundamental de estar no mundo” (p. 45) que se apresenta em três dimensões entrelaçadas: correspondência, cuidado e saudade. Retomando a ideia de “políticas do cuidado”, proposta por Viviane Mancovsky (2015), como inspiração para enfrentar as dificuldades do processo de afiliação, indagamos sobre a ampliação e fortalecimento das iniciativas das Universidades para fomentar o engajamento da comunidade acadêmica no complexo processo de afiliação estudantil. No caso específico da UEFS, elaboramos este projeto de extensão como contribuição ao conjunto das atividades que têm sido desenvolvidas nesta área, considerando que ainda são necessárias muitas novas iniciativas para enfrentar os obstáculos à bem-sucedida afiliação estudantil.
O projeto será realizado por meio de oficinas presenciais e quinzenais com estudantes de graduação que ingressaram na UEFS entre 2023 e 2024; portanto, matriculados entre o 1º e o 3º semestres. Por meio de divulgação de formulário eletrônico enviado por e-mail, os estudantes que se interessarem serão selecionados para integrar o projeto. As oficinas terão duração de duas horas para realização das atividades. Os temas versarão sobre o processo de afiliação estudantil, seus obstáculos e possibilidades de superação. A condução das oficinas será realizada pela professora Maria Eunice, responsável pelo projeto de extensão, contanto com seleção de dois(duas) monitores (as). Seguindo a teoria da afiliação estudantil, serão desenvolvidos subtemas que darão a conhecer e problematizar os “três tempos” caracterizados por Coulon (2008). Assim, organizadas em três módulos, as oficinas realizarão atividades sobre: 1) o “tempo de estranhamento”, 2) o “tempo da aprendizagem” e 3) o “tempo da afiliação”. Cada módulo será composto por duas oficinas, totalizando seis oficinas ao final do primeiro semestre do ano de 2024. No segundo semestre, o projeto abrirá novas inscrições para iniciar mais uma sequência de três módulos. Iniciando com o Módulo 1 (tempo de estranhamento), a primeira oficina reunirá os estudantes em uma roda de conversa sobre as primeiras experiências vivenciadas na UEFS e como estas têm reverberado no processo de adaptação à vida universitária. O tema da afiliação estudantil será introduzido a partir deste primeiro encontro e a escuta atenta dos participantes dará ensejo à percepção dos elementos que o grupo sente necessidade de aprofundar na segunda oficina. Neste aspecto, ressalta-se a metodologia qualitativa que privilegia a construção coletiva a partir dos encontros entre os sujeitos participantes. O Módulo 2 (tempo de aprendizagem), versará sobre as diferentes formas como os participantes da oficina lidam com o cotidiano de estudos, as demandas institucionais e as exigências da vida acadêmica. As oficinas farão um inventário das dificuldades enfrentadas e, a partir de atividades em grupo, os participantes pensarão coletivamente em soluções para cada desafio. Em seguida cada grupo apresentará as reflexões exercitando a criatividade em uma cena dramatizada. O Módulo 3 (tempo de afiliação), tematizará elementos para a afiliação intelectual e institucional. As oficinas contarão com a visita de estudantes veteranos, no último ano do curso, que irão partilhar suas experiências com a iniciação científica, grupos de estudos, monitoria, atividades de campo, atividades extensionistas e movimentos sociais na UEFS. Em cada módulo os participantes escreverão sobre seu processo de afiliação na UEFS, constituindo uma narrativa autobiográfica estudantil. Pretende-se reunir o conjunto narrativo em uma publicação que versará sobre o projeto de extensão e seus resultados. A escolha da narrativa autobiográfica está apoiada nos estudos que versão sobre a relação entre a escrita de se o processo de formação (Abrahão; Cunha; Bôas, 2018). A reflexão autobiográfica convoca o sujeito a iluminar aspectos da vida estudantil, estabelecer nexos antes invisíveis, perceber a complexidade formativa que se estabelece em sua vida. Segundo Pereira e Mota (2015, p. 106), “Não apenas narramos, como nos reinventamos em nosso fazer, em nossas memórias, reflexões e aprendizagens, e nos encontramos nas histórias biografadas.”
Contribuir para o desenvolvimento de um ambiente universitário de atenção e escuta do estudante em processo de afiliação estudantil.
1) Realizar atividades formativas que promovam a compreensão do processo de afiliação estudantil, seus obstáculos e possibilidades de superação; 2) Desenvolver um ambiente formativo acolhedor que propicie modos de subjetivação favoráveis à construção de um percurso de afiliação bem-sucedido; 3) Promover uma micropolítica comprometida com a permanência estudantil na UEFS.
Com as políticas públicas de ações afirmativas, a educação superior na Bahia vem modificando o perfil dos seus estudantes, abrindo-se à pluralidade e maior representatividade da sua população. A UEFS iniciou a implementação das cotas sociais e raciais em 2007 (UEFS, 2018); portanto, após dezesseis anos, a entrada de estudantes de origem popular e de trabalhadores-estudantes compôs um panorama mais democrático e plural para o desenvolvimento da região. A mobilidade social apresenta-se como possibilidade para jovens negros, indígenas e quilombolas, muitos ainda constando como os primeiros de suas famílias a obter diploma universitário. Entretanto, a evasão continua a ser um fenômeno constante, apesar da política de permanência estudantil instaurada para auxiliar o corpo estudantil a enfrentar as dificuldades materiais e simbólicas na universidade. Segundo relatório da Pró-Reitoria de Políticas Afirmativas e Assuntos Estudantis: “[...] situações de discriminação étnico-racial vivenciadas pelos estudantes pertencentes a grupos excluídos historicamente do ensino superior como, por exemplo, os estudantes indígenas e quilombolas, também contribuem para a evasão. Esta é aqui compreendida como as situações envolvendo abandono e cancelamento. O abandono é compreendido como situação na qual o estudante apresenta três semestres consecutivos sem aproveitamento. Já o cancelamento refere-se aos que solicitaram ruptura de vínculo com a Instituição.” (UEFS, 2018, p. 61) Neste contexto, é imperioso elaborar medidas pedagógicas que resultem em suporte efetivo aos novos perfis de estudantes. Diante do necessário processo de afiliação para tornar-se estudante universitário (Coulon, 2008), cabe refletir sobre a devida atenção pedagógica que as universidades precisam oferecer aos calouros. É urgente desenvolver estudos e práticas que adotem a postura de escuta dos atores sobre as circunstâncias que cercam suas vidas e percursos como estudantes de universidades públicas. O presente projeto de extensão tem sua concepção e embasamento teórico fundados no meu estágio pós-doutoral no Programa de Pós-Graduação Estudos Interdisciplinares sobre a Universidade (PPGEISU-UFBA) sob supervisão da Dra. Sônia Sampaio, fundadora do Observatório da Vida Estudantil. Enquanto docente da UEFS, tenho o objetivo de contribuir com o desenvolvimento do necessário entrelace entre ensino, pesquisa e extensão, assim fortalecendo os rumos democráticos que educação superior pública tem tomado no país. No Brasil, os estudos sobre a democratização do acesso ao ensino superior vinculada às políticas de ações afirmativas têm demonstrado a importância da implementação e aprofundamento das políticas de permanência estudantil. Segundo Sampaio e Santos (2022) A ampliação do acesso ao ensino superior no Brasil possibilitou uma reconfiguração no interior das universidades brasileiras, principalmente, no que diz respeito ao seu público estudantil e às pautas debatidas nesse contexto. Este processo que, inicialmente, se deveu à iniciativa do movimento negro em articulação com o movimento estudantil, dos povos indígenas e das pessoas com deficiência, abriu a discussão sobre ações afirmativas para outros segmentos até então afastados das lutas pelo direito à educação como as pessoas trans (transgêneros, travestis e transexuais) ou ainda lésbicas e homossexuais. Ao receberem jovens antes praticamente sem acesso a esse ambiente formativo, as universidades estão sendo pressionadas a rever suas principais diretrizes, tanto no âmbito das políticas de assistência, como nos seus currículos e conteúdos, decisões pedagógicas e práticas acadêmicas e relacionais. Neste sentido, o projeto “Afiliação estudantil na UEFS: micropolítica e subjetividade” pretende contribuir para construção de um ambiente universitário de atenção e escuta do estudante em processo de afiliação estudantil, fortalecendo aspectos fundamentais à democratização do ensino superior. Entre eles, a compreensão sobre a mudança do perfil de estudantes ingressantes, suas demandas e dilemas enquanto sujeitos em processo de adaptação à vida universitária. Desse modo, o projeto alinha-se às políticas de permanência na UEFS.

Histórico de movimentação
07-03-2024 18:16:15

Criação da proposta

22-07-2024 16:55:08

Parecer da Câmara de Extensão

Resolução CONSEPE publicada.
07-03-2024 21:07:38

Em Análise

Proposta enviada para análise da Câmara de Extensão
22-07-2024 16:55:08

Aprovado

Resolução CONSEPE publicada.
22-07-2024 16:55:25

Ativo

Projeto ativo após aprovação pela Câmara de Extensão.
v1.4.13
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